Com mais de 20 anos de experiência no mercado editorial internacional, Lulu Skantze será uma das palestrantes do FIPP Insider São Paulo, evento internacional que acontece no próximo dia 5 de junho. A executiva brasileira, que construiu uma carreira sólida no mercado editorial europeu, retorna ao país para compartilhar insights sobre estratégias criativas de licenciamento e oportunidades de crescimento para publishers locais. E nos concedeu uma entrevista para falar sobre seu trabalho e suas expectativas para a palestra.
O FIPP Insider São Paulo será realizado no campus Álvaro Alvim da ESPM, em parceria com a Associação Nacional de Editores de Revistas (ANER). O evento marca o retorno da FIPP ao Brasil após 23 anos e faz parte das comemorações do centenário da organização, fundada em 1925. As inscrições são gratuitas, mas as vagas são limitadas.
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Licenciamento no DNA
Fundadora e diretora criativa da revista infantil Storytime, uma marcaque tem o licenciamento no DNA desde a sua criação, em 2014, Skantze traz uma perspectiva sobre como marcas editoriais podem expandir além das fronteiras tradicionais:
O licenciamento fortalece a marca da revista, cria ecossistemas de temas e posiciona a edição impressa como uma vitrine
A revista infantil de Lulu Skantze exemplifica como o licenciamento editorial pode impulsionar a expansão internacional. Atualmente publicada em cinco países, a Storytime oferece versões impressa, digital e em áudio, demonstrando a convergência de formatos que caracteriza o mercado editorial contemporâneo.
Durante sua apresentação no evento, a executiva pretende abordar como os publishers brasileiros podem desenvolver uma mentalidade voltada para licenciamento desde o processo criativo inicial:
Tudo começa com uma mentalidade voltada para o licenciamento, e quero mostrar como desenvolver ou adaptar-se a essa mentalidade desde o início do processo criativo

Oportunidades para o mercado brasileiro
Lulu Skantze identifica oportunidades significativas no mercado brasileiro, especialmente pela velocidade com que o público local adota novidades.
A maior oportunidade e o que mais me impressiona no Brasil é a velocidade com que o público adota novidades. Não conheço mercado mais aberto a testar, mudar hábitos, digitalizar processos
Entre os temas que serão explorados na palestra estão as estratégias de monetização através de licenciamento, a criação de ecossistemas multiplataforma e o desenvolvimento de parcerias internacionais.
A palestrante também destacará como o conteúdo editorial pode ser adaptado para diferentes mercados mantendo sua essência global, mas com aplicação local.
O FIPP Insider São Paulo reunirá outros palestrantes de destaque, incluindo Paulo Henrique Ferreira, da Barões Brand Publishing, Max Frost, da RocaNews, e Alastair Lewis, CEO da FIPP.
O evento promete ser uma oportunidade única para profissionais do mercado editorial brasileiro se conectarem com tendências globais e estabelecerem parcerias estratégicas.
Veja abaixo a entrevista completa com Lulu Skantze:
Você é brasileira mas está fora do país há muitos anos. Primeiramente, gostaria de pedir para falar um pouco sobre você e sua carreira. De onde é, onde se formou em jornalismo, quais especializações fez e por onde passou.
Sim! Na verdade, sempre trabalhei fora do Brasil, e essa é a primeira vez que estou participando do mercado aí — e também a primeira vez que faço uma apresentação em português. Estou animada e um pouquinho ansiosa! Sou formada em Publicidade pela PUC Paraná, em Curitiba, e logo depois fui trabalhar na agência Grey, em Düsseldorf, na Alemanha. Fiz mestrado em Comunicação Visual na Central Saint Martins, em Londres, além de cursos em análise de tendências (Trend Forecasting). Logo em seguida, acabei migrando para o mercado editorial.
Durante quase dez anos, trabalhei criando revistas sobre os mais diversos temas e com muitos produtos licenciados, atuando como diretora criativa e responsável por novos projetos. Após alguns lançamentos de sucesso — especialmente em 2013, quando uma das revistas que criei para a DeAgostini ganhou o prêmio Bronze de Lançamento do Ano no Reino Unido — decidi, junto com meu sócio Leslie Coathup, lançar nossa própria publicação. Além de continuar desenvolvendo projetos para outras editoras, nos tornamos uma editora independente. Em 2014, lançamos a Storytime, uma revista infantil que hoje tem versões impressa, digital e em áudio, publicada atualmente em cinco países.
Também passo parte do meu tempo na Escandinávia e recentemente entrei para o conselho da Tauko, uma revista finlandesa de costura e sustentabilidade. Sempre tive facilidade com idiomas e gosto muito de trabalhar com times multiculturais, então espero continuar ampliando meu portfólio editorial. Morei em Londres por 23 anos e, desde 2022, me divido entre Amsterdã e Londres.
No ano passado, você esteve no FIPP World Congress como correspondente da ANER. Como surgiu essa oportunidade e o que você achou do evento?
Foi justamente nesse congresso que conheci a Regina Bucco (Diretora-Executiva) e o Rafael Soriano (Presidente), que me apresentaram o trabalho incrível da ANER no Brasil e me convidaram para ser correspondente e fazer essa ponte com o mercado aí! Esse encontro, aliás, é um ótimo exemplo do que os eventos da FIPP têm de melhor: eles realmente conectam pessoas e criam oportunidades de colaboração.
Participo dos eventos da FIPP desde 2017. E, mais recentemente, também como palestrante. Não conheço outro evento em que tanta gente relevante do setor editorial esteja reunida no mesmo lugar. A maioria dos encontros de mídia é muito dispersa, mas a FIPP é extremamente focada em revistas e jornais — e faz isso com excelência. O que mais gostei no convite da Regina e do Rafael foi a chance de me reconectar com a criatividade do mercado editorial brasileiro, que admiro muito.
Com base no que você pode experienciar no FIPP World Congress 2024, o que podemos esperar do FIPP Insider em São Paulo?
Acredito que será uma troca genuína de conhecimentos e de cases inspiradores. O legal dos eventos FIPP Insider — que acontecem em diversas cidades ao redor do mundo — é que eles também servem para a FIPP conhecer melhor os mercados locais e ampliar o radar global, o que sempre resulta em trazer mais do Brasil para o mundo. Eles querem entender o que está acontecendo no Brasil, o que há de novo, de diferente.
A cobertura da mídia é importante, mas é nos encontros presenciais, nos painéis e debates, que surgem as informações mais frescas e relevantes. Essa troca direta é o grande trunfo desses eventos — todos saem ganhando. E acho que este, em especial, será bem interativo e empolgante e bem completos. Fizemos a curadoria pensando em todos os tópicos que gostamos de cobrir, desde o futuro e, claro, a IA, mas também monetização, licenciamento, digitalização, o novo jornalismo, educação e anunciantes. A ideia é realmente ter uma visão bastante completa das tendencias para os publishers em todos os aspectos.
A última vez que a FIPP esteve no Brasil foi em 2001, e eles estavam ansiosos para voltar. Quando a ANER propôs a parceria, a FIPP aceitou na hora — e a ANER tem sido fantástica ao organizar tudo em tão pouco tempo e montar painéis com palestrantes locais que estamos muito curiosos para ouvir.
Sua palestra no FIPP Insider vai falar de “Estratégias criativas de licenciamento e oportunidades de crescimento”. Poderia nos dar uma prévia dos principais insights que você compartilhará com os editores brasileiros, especialmente considerando seu vasto trabalho com licenciamento para marcas globais e com a presença da Storytime em múltiplos mercados?
Muita gente no Brasil me pergunta como a mídia impressa pode sobreviver em um mundo cada vez mais digital. O que vejo por aqui é que o impresso está passando por uma reinvenção — e isso inclui diversificação de produto, novos formatos e, principalmente, potencial de licenciamento.
Vou falar sobre esse movimento e como pensar o conteúdo de forma estratégica para que ele possa ocupar novos espaços e gerar novas receitas.
A Storytime, por exemplo, nasceu com licenciamento no DNA. E estou agora também desenvolvendo um projeto de licenciamento com a TAUKO, usando o que já existe lá como base mas começando com o que ja existe.
O licenciamento fortalece a marca da revista, cria ecossistemas de temas e posiciona a edição impressa como uma vitrine. Ela não é suficiente por si só — mas é o ponto de partida. Tudo começa com uma mentalidade voltada para o licenciamento, e quero mostrar como desenvolver ou adaptar-se a essa mentalidade desde o início do processo criativo e assim, espero, agregar longevidade a todo conteúdo que a gente produz.
A Storytime é uma marca editorial infantil que alcançou vários países. Como o licenciamento – seja de personagens próprios ou de terceiros – contribuiu para essa expansão e como você enxerga a aplicação de estratégias criativas de licenciamento para marcas editoriais que buscam não apenas monetizar, mas também fortalecer sua identidade e cruzar fronteiras, incluindo o mercado brasileiro?
A primeira coisa que uma revista precisa para ser licenciada — além de conteúdo excelente e original — é uma marca forte. No caso de revistas e jornais, uma marca forte não depende de personagens ou produtos, mas sim dos valores e da relevância que a publicação conquista em seu setor.
Claro que identidade visual conta, mas o mais importante é ter uma voz autêntica e estar presente em vários espaços. Todo o conteúdo precisa refletir essa voz e ser facilmente reconhecível como parte daquela publicação. Além disso, acredito que o conteúdo hoje precisa ser global em essência, mas local na forma.
Na Storytime, isso é fundamental. Trabalhamos com histórias de todas as culturas e com criadores do mundo inteiro. Isso atraiu parceiros internacionais — eles viram que nosso conteúdo é diverso, global e relevante, mas que pode ser adaptado localmente. Temos uma qualidade de storytelling britânica — como se espera de uma revista em inglês —, mas com uma riqueza cultural que conversa com leitores em qualquer lugar.
O Brasil, nesse sentido, tem uma vantagem enorme: é naturalmente multicultural. Sempre foi, tanto na criação quanto no consumo de conteúdo. Essa “atitude global” foi muito mais difícil de implementar aqui fora no início. As pessoas duvidavam da proposta da Storytime. Hoje, é uma abordagem bastante copiada e referenciada.
Como observadora do mercado editorial e das mídias, quais são as tendências mais promissoras no campo do licenciamento que os editores (especialmente os de revistas e conteúdo nichado) devem observar nos próximos anos? E como a convergência entre impresso, digital e áudio, que você explora com a Storytime, impacta essas oportunidades de licenciamento?
Acho que hoje não dá mais para falar em “leitores” — temos consumidores e esse o público quer experiências completas. E isso já diz muito. Ele espera que as marcas de conteúdo estejam em todos os espaços: físico, digital, social, sonoro. E, especialmente no conteúdo de nicho, vemos a formação de microcomunidades — que é o novo ouro do mercado. Essas comunidades buscam pertencer, trocar, cocriar.
Por isso, vemos modelos de assinatura se transformando em membership, com mais eventos, mais colaborações entre marcas e mais engajamento direto. Para acompanhar esse público, precisamos sair da bolha editorial e aprender com outros setores. Mas para fazer isso bem feito, acredito fortemente no poder das parcerias — e por isso os eventos presenciais continuam tão relevantes. São neles que surgem essas conexões que viram projetos de verdade.
Pensando especificamente no mercado editorial brasileiro, com suas particularidades e potencial, quais você acredita serem os maiores desafios e, inversamente, as maiores oportunidades ainda pouco exploradas quando se trata de licenciamento de conteúdo e marcas por parte dos publishers locais?
O maior desafio, na minha opinião, é uma mentalidade que insiste em ver mais os obstáculos — escuto muito nas reuniões “aqui é mais difícil”, “o mercado é complicado” — em vez de focar nas vantagens que o Brasil oferece, especialmente para quem olha de fora. Até porque hoje em dia vejo que os desafios são muito mais parecidos em todos os lugares do que percebemos, não são mais problemas tão localizados.
Se os publishers locais conseguirem mostrar para nós, parceiros internacionais, como funcionam os modelos de negócio aí e que tipo de parceria faz sentido no contexto brasileiro, isso já facilitaria muito. Vocês precisam oferecer um modelo de parceria que funcione aí pra gente – porque o mais difícil é sempre traduzir isso.
Um exemplo: a conversão do dólar pode assustar, mas o Brasil tem números de circulação muito maiores do que a maioria dos países europeus. Dá para fazer contratos invertidos — com valor inicial menor e promessas de audiência e escala maiores. É assim que fazemos na Índia e na África do Sul.
A China por exemplo nos explicou o modelo deles e fizemos a parceria com um modelo “Chinês” de crescimento e contratação o – não com o nosso usual, que usamos em países mais parecidos com o Reino Unido. Então diria que o Brasil precisa ensinar os parceiros internacionais como fazer parcerias e negócios no Brasil junto com eles.
A maior oportunidade e o que mais me impressiona no Brasil é a velocidade com que o público adota novidades. Não conheço mercado mais aberto a testar, mudar hábitos, digitalizar processos. Isso é ouro para quem está criando. Aqui fora, tudo é mais lento as pessoas são apegadas a tradições e demoram a mudar. No Brasil, cada nova ideia tem a chance real de virar tendência. Isso faz do país um dos melhores lugares do mundo para testar e lançar produtos.
Vejo também oportunidades pouco exploradas no cruzamento com o setor educacional, que no Brasil tem escala e demanda por conteúdo de qualidade — especialmente materiais que incentivem a leitura e possam ser usados em escolas ou projetos sociais. Na verdade meu sonho seria participar de algum projeto assim por aí. Falo muito disso nas minhas palestras – da importância de investirmos nisso e acho que seria incrível!
Além disso, há um potencial enorme em criar parcerias com marcas de entretenimento e plataformas de streaming, estendendo narrativas editoriais para novos formatos. O público brasileiro é altamente conectado e mobile-first, então isso abre espaço para experiências editoriais digitais — newsletters, apps, áudio, redes — que fortalecem a marca como um ecossistema multiplataforma. E, por fim, vejo um enorme valor em trazer o público jovem (que também é uma porcentagem maior da população mais aí do que aqui) como cocriador, não só como consumidor: dar voz e espaço para essa geração participar é uma forma poderosa de engajamento e de construção de comunidade.
FIPP Insider São Paulo
Data: 5 de junho de 2025
Horário: 8h15 às 18h45
Local: Campus Álvaro Alvim da ESPM (Rua Dr. Álvaro Alvim, 123, Vila Mariana)
Inscrições: Gratuitas (Clique aqui para se inscrever)