Diferentemente da publicidade tradicional ou da assessoria de imprensa, o Brand Publishing é uma disciplina que exige processos estruturados e uma visão clara de objetivos para entregar conteúdo relevante e construir relacionamentos duradouros com audiências específicas. Essa abordagem, que vai além do jornalismo de marca tradicional, demanda uma produção de conteúdo “sem firulas”, como define o jornalista Beto Francellino, Head de Conteúdo da Barões Brand Publishing e um dos autores do livro  “Brand Publishing na Prática“, lançado em outubro de 2024, pela editora Robecca & Co.

Ao abordar a relevância da disciplina no cenário atual do mercado da comunicação corporativa, Francellino explica:

O Brand Publishing tornou-se uma necessidade porque o ambiente digital deu poder ao público, que escolhe o que consumir e rejeita interrupções. As marcas precisam oferecer valor e informação útil para construir um relacionamento direto e contínuo

Na entrevista a seguir, o jornalista detalha como a Barões desenvolveu metodologias próprias para a produção de conteúdo, incluindo os “kits de conteúdo”, que organizam entregas em formatos como Hub, Help e Hero. Ele também revela como a estruturação de uma redação com papéis bem definidos e processos claros permite escalar projetos sem perder qualidade.

Entre os temas abordados estão a definição de Pillar Contents (pilares de conteúdo estratégicos), a “Diplomacia Editorial” como ferramenta de relacionamento com stakeholders e o papel das marcas como novos players editoriais responsáveis pela construção de seus mercados.

Para profissionais de comunicação, gestores e estudantes interessados em compreender como implementar estratégias de Brand Publishing eficientes, o papo a seguir oferece insights valiosos sobre métodos testados e comprovados que transformam a subjetividade da criação de conteúdo em processos objetivos e mensuráveis. Acompanhe!

Entrevista com Beto Francellino

Você define brand publishing como “jornalismo de marca, mas é isso e mais um pouco”, uma forma estratégica das marcas conversarem com seus públicos. Por que essa abordagem se tornou tão crucial hoje, com a digitalização e as redes sociais? E qual a diferença fundamental para a publicidade e a assessoria de imprensa?

O Brand Publishing tornou-se uma necessidade porque o ambiente digital deu poder ao público, que escolhe o que consumir e rejeita interrupções. As marcas precisam oferecer valor e informação útil para construir um relacionamento direto e contínuo. É mais que jornalismo de marca porque envolve uma estratégia de longo prazo para criar e reter uma audiência própria.

Diferentemente da publicidade, que geralmente promove diretamente e interrompe, o Brand Publishing atrai pela relevância do conteúdo.

E ao contrário da assessoria de imprensa, que busca espaço em mídia de terceiros e depende da agenda deles, o Brand Publishing transforma a marca em seu próprio veículo, com controle total sobre a narrativa e o canal.

Você defende uma gestão “objetiva e sem firulas”, um “método quase cartesiano”, em contraste com a reatividade do jornalismo. Como aplicar isso na prática em um campo criativo como o conteúdo, e pode dar um exemplo de processo que mitiga a subjetividade?

Aplicar um método objetivo significa trazer planejamento estratégico, execução consistente e mensuração para a produção de conteúdo, em vez da correria reativa comum no jornalismo diário. A criatividade não é eliminada, mas direcionada para cumprir metas claras. Um exemplo prático de retirada da subjetividade do conteúdo são nossos “kits de conteúdo”. Ter formatos pré-definidos, como um “Help com SEO” ou um “Hub Plus”, com estruturas e objetivos claros, garante que a produção não seja guiada apenas pelo “acho que seria legal”. Cada peça é criada com uma função estratégica específica em mente, seja ranquear no Google, aprofundar o relacionamento ou gerar leads, garantindo que a criatividade sirva a um propósito mensurável.

Como a evolução do framework HHH para os “kits de conteúdo” mais detalhados (Hub Plus, Help com SEO, etc.) ajuda na prática a entregar valor consistente ao cliente e relevância ao público?

Essa estruturação mais detalhada com os kits de conteúdo traduz a teoria do HHH em entregáveis tangíveis e específicos. Para o cliente, isso significa clareza sobre o que será produzido, qual o propósito de cada conteúdo e como ele se encaixa na estratégia geral, facilitando o alinhamento de expectativas e a mensuração de resultados. Para o público, essa variedade de formatos estruturados garante que ele encontre o tipo de conteúdo adequado para sua necessidade do momento – seja uma resposta rápida, uma explicação aprofundada ou uma análise inspiradora – aumentando a percepção de valor e relevância da plataforma da marca.

Como funciona na prática a definição dos “Pillar Contents” com o cliente, e qual o papel do SEO nesse processo para construir autoridade e garantir que o conteúdo seja encontrado?

A definição dos Pillar Contents, os grandes temas de autoridade da marca, é um processo colaborativo. Analisamos profundamente os objetivos de negócio do cliente, sua expertise e seu público-alvo. Paralelamente, realizamos uma pesquisa de SEO extensa para entender o que as pessoas buscam, quais termos têm volume, qual a intenção de busca e como a concorrência atua. Os pilares emergem do cruzamento entre a estratégia da marca e as oportunidades identificadas no SEO.

O SEO é fundamental não só para escolher temas com potencial de tráfego, mas também para orientar a estrutura dos pilares e dos conteúdos relacionados, garantindo que sejam encontrados pelo Google e construam, de fato, a autoridade da marca naqueles assuntos ao longo do tempo.

Poderia explicar melhor a estratégia de “Diplomacia Editorial” e o impacto que observam no engajamento e relacionamento com clientes e prospects ao oferecer espaço no ativo de mídia da marca?

A “Diplomacia Editorial” é um dos usos mais estratégicos de um projeto de brand publishing. Significa usar o ativo de mídia da marca como uma ferramenta de relacionamento, convidando stakeholders importantes – clientes, prospects, parceiros e especialistas – para contribuir com conteúdo. Isso pode ser um artigo de um cliente sobre um case, uma entrevista com um especialista, a participação em um webinar. Ao oferecer sua plataforma, a marca demonstra abertura, valoriza seus parceiros e enriquece seu conteúdo. O impacto é muito positivo: humaniza a marca, aumenta a credibilidade, amplia o alcance porque os convidados tendem a compartilhar, e fortalece o relacionamento com clientes e prospects que veem seus pares e referências interagindo com a marca, construindo uma comunidade engajada.

Quais foram os principais desafios ao implementar a estrutura de “Redação” processualizada da Barões, com papéis definidos, e como isso impactou a qualidade e a escalabilidade dos projetos?

Foi uma longa construção envolvendo uma grande parte do time então constituído. O principal desafio foi a mudança cultural, tanto interna quanto de mercado, acostumado a modelos menos segmentados.

Definir papéis claros como gestores estratégicos, redatores-executivos focados em qualidade e processo, e redatores plenos na execução exigiu muito alinhamento e treinamento.

No entanto, o impacto na qualidade é notável, pois cada etapa recebe atenção especializada, garantindo consistência editorial. Em termos de escalabilidade, essa estrutura processualizada é o que nos permite lidar com múltiplos projetos e clientes simultaneamente, mantendo o padrão de entrega e facilitando a integração de novos membros à equipe sem depender apenas de talentos isolados.

Como a classificação dos “Kits de Eventos” (P, M, G) ajuda a alinhar expectativas com clientes e permite que a marca-publisher compita com veículos tradicionais nessas coberturas?

Os Kits de Eventos (Pequeno, Médio, Grande) trazem objetividade e previsibilidade para a cobertura de eventos, definindo escopo, entregáveis e equipe. Isso alinha as expectativas com os clientes desde o início, deixando claro o investimento e o retorno esperado. A competição com veículos tradicionais não se dá necessariamente em volume ou velocidade, mas em relevância estratégica para o público da marca – e para o publisher em si. Os kits permitem planejar uma cobertura focada em ângulos e conteúdos que reforcem a mensagem da marca e ofereçam valor único à sua audiência específica, como análises aprofundadas ou entrevistas exclusivas, fazendo um uso eficiente dos recursos para gerar impacto direcionado.

Que lições específicas da transição digital da mídia do século XX foram mais importantes para estruturar o método da Barões?

Aprendemos muito com os desafios enfrentados pela mídia tradicional — até porque todos nós viemos desse universo. Algumas lições ficaram especialmente marcadas nesse caminho: a importância de colocar a audiência no centro de tudo, a urgência de trabalhar com processos ágeis e prontos para se adaptar às mudanças constantes do digital, a necessidade de medir resultados e usar os dados como bússola estratégica, além da vantagem de integrar talentos e áreas, em vez de manter tudo separado em silos. E, claro, entendemos que é fundamental buscar um modelo sustentável, que realmente construa valor de longo prazo para a marca. Foi a partir dessas lições que moldamos nossa forma de atuar: com método, foco e resultado.

Como você vê o papel e a responsabilidade das marcas publishers, esses “novos players editoriais”, na construção de seus mercados e de uma “sociedade melhor”?

Marcas que atuam como publishers sérios têm um papel importante na educação e informação de seus mercados, podendo influenciar positivamente o debate e as práticas do setor – inclusive atuando no combate à desinformação. Sua responsabilidade reside na transparência, na precisão da informação e na ética editorial.

Ao fornecerem conteúdo útil, confiável e que promove conhecimento ou diálogo construtivo em sua área de atuação, essas marcas contribuem sim para um mercado mais informado e, em sua esfera, para uma sociedade melhor, usando a comunicação para gerar valor compartilhado.

Para uma marca convencida do Brand Publishing, mas sem saber por onde começar a estruturar a gestão de conteúdo, qual seria seu conselho mais importante ou o primeiro passo?

O conselho mais importante é: defina com clareza seus objetivos estratégicos e conheça profundamente seu público-alvo. Antes de qualquer planejamento tático de conteúdo ou processo, a marca precisa saber por que está fazendo isso e para quem está falando. Quais metas de negócio o Brand Publishing deve suportar? Quais são as dores, necessidades e comportamentos da audiência que se quer atingir? O que você quer saber sobre sua audiência? Responder a essas duas perguntas fundamentais é o primeiro e indispensável passo para construir uma gestão de conteúdo estratégica e eficaz.