Os 15 anos de constante crescimento profissional, passados boa parte dentro do olho do furacão das transformações trazidas pela revolução digital, levaram a carioca Bárbara Bono, ou Babi como gosta de ser chamada e é conhecida por muitos, a construir uma carreira muito bem sucedida no mercado da comunicação. Mas, ao mesmo tempo, geraram nela um inquietante e desafiador questionamento: “e agora? Daqui para onde?”. Para encontrar respostas e direcionamentos, ela embarcou numa viagem de cem dias por algumas das principais capitais do mundo. Visitou cerca de 30 empresas, foi a grandes eventos, fez cursos e buscou tendências. E poucos dias depois de chegar ao Brasil, conversou com o Brand Publishing Brasil. Nesse papo, ela divide conosco um pouco de sua visão sobre os rumos do mercado, após a recente jornada em busca de conhecimento e novos modelos de negócio em comunicação para marcas.

Currículo de peso e intraempreendedorismo

Babi tem passagens por grandes agências de publicidade, como a Artplan – onde trabalhou com clientes como Rock in Rio, Coca-Cola, Lóreal, Tim, Amil, entre outros – além de agências digitais, de relações públicas e trabalhos como produtora. Atualmente, é Head de Conteúdo e Criação da Fiat Chrysler Automóveis (FCA).

“Em todas as empresas por onde passei, eu intraempreendi, montando departamentos que não existiam, ou que estavam começando existir, algo como um disco voador pousando, sem que a gente soubesse muito bem o que fazer. Tudo isso, justamente, por conta dessa mudança radical que o meio digital trouxe para o mercado nos últimos dez anos, com novas narrativas, linguagens e disciplinas. Passado todo esse tempo, entendi que havia chegado num momento de pensar: “e agora, daqui para onde?”. Pela primeira vez eu vi a coisa um pouco nebulosa. Porque a informação está aí, as pessoas já sabem que é importante. Mas existe um problema que é cultural. De quem não quer mudar, por estar apegado ao passado. E nesse caso, não acredito que a resistência à mudança seja mais por desinformação”, diz Bárbara Bono. “Justamente por ser uma questão cultural, eu dei uma travada para pensar o que a gente precisa fazer daqui para frente. Por isso, resolvi estruturar essa viagem de três meses e meio. Esse giro foi muito importante para oxigenar a cabeça e pensar em planos que façam sentido para as marcas e para as estruturas de comunicação”, completa.

Primeiras conclusões

Como resultado da viagem, Babi enumerou algumas conclusões importantes:

1. “Não existe apenas um modelo de “para onde a coisa tem que ir”. Existem vários”.

2. “O Brasil não está tão atrás assim. Pelo contrário. Estamos bem à frente em vários aspectos, especialmente no que diz respeito à criatividade. Somo muito bons. E no digital também, pois somos viciados em internet. Somos um dos países mais conectados, onde as pessoas usam realmente as redes sociais muito mais do que em qualquer outro lugar. E isso fez com que a gente ficasse bem à frente em algumas de estratégias”.

3. “Mas tem uma questão de dados que a gente precisa olhar melhor, porque acho que a gente coleta muito hoje e não sabe muito bem o que fazer com isso ainda, não cruza bem as informações”.

Insights na bagagem

Dentre as diferentes estratégias de conteúdo de marcas, há objetivos distintos e outros em comum. E uma das conquistas mais almejados por todos os profissionais do ramo é o domínio das técnicas que permitem uma conversa direta com o consumidor. Na bagagem de seu giro pelo mundo, Babi trouxe insights sobre o que, em sua opinião, já começa a ser uma tendência, por conta das mudanças de hábitos dos consumidores.

“O que acredito que já é tendência nos últimos anos pra cá e que terá sua virada ano que vem é a conversa sobre comunidade. A gente está voltando cada vez mais para o nicho do nicho do nicho. Para o que realmente nos interessa. É quase uma mentalidade da época do Orkut, das comunidades temáticas que tinham total relação com o comportamento das pessoas. É só observar que a maior parte das recomendações (quase 80%) sobre marcas, produtos, serviços, acontece dentro de fóruns privados como Whatsapp e Messengers. A gente precisa ir no núcleo, no centro de interesse das pessoas, uma vez que tem muita coisa sendo produzida por todos os lados. Muito conteúdo gerado todo dia por marcas e pessoas. Já chegamos num ponto que tem mais conteúdo na internet do que formiga no mundo. Isso é muito louco. Quem vai consumir tudo isso? Por exemplo, até pouco tempo atrás o marketing de influência era a cereja do bolo. Mas até esse modelo ressignificou. Vimos grandes influenciadores perderem relevância porque não possuem mais autenticidade e isso não é moeda de troca hoje em dia. Não dá para o influenciador falar a cada semana que ele está no hotel favorito dele. Acaba com a credibilidade dele e da marca. Então, a gente está olhando cada vez mais para microinfluenciadores. Não é sobre o número apenas, sobre quem tem milhões de seguidores. Mas sobre quem tem verdade no que fala, gera mais endosso, mais empatia e pluga seu propósito com o propósito da marca. E isso não está necessariamente nas grandes audiências”, avalia Bárbara Bono.

A gente está tendo que ir no núcleo, no centro de interesse das pessoas, uma vez que tem muita coisa sendo produzida. Muito conteúdo sendo gerado.

A força do consumo consciente

Babi destaca movimentos recentes que andam ganhando muita força de mercado, como novos modelos de agências que estão surgindo e as startups. Segundo ela, é muito mais difícil para uma organização grande fazer uma mudança de mentalidade. Para agilizar esse processo, elas estão fazendo suas próprias startups, seus hubs e núcleos, para depois pegar essa cultura e passar para dentro. E uma das mudanças que chegam na carona da transformações dos hábitos do consumidor é o chamado consumo consciente.

“Tem essa tendência do conteúdo do ‘bem’ e dessa coisa de ir mais para o micro e para as comunidades. Mas não é só isso. Tem a necessidade das pessoas de, cada vez mais, consumir coisas boas. E de cobrar isso das empresas também. Porque a gente não está mais aguentando tanta fake news, tanta notícia ruim. E com isso, você vê um movimento de players de conteúdo, como BuzzFeed e TikTok, que usam o algoritmo a seu favor para criar uma rede e um feed de conteúdos positivos. Eu visitei cada um deles nessa jornada dos cem dias. O BuzzFeed, por exemplo, se vende como uma empresa de dados que gera um conteúdo positivo para as pessoas com base nesses dados. O TikTok tem uma preocupação enorme de que a plataforma continue produzindo conteúdos positivos, até porque sua audiência ainda é muito jovem. Se for ao contrário, você não mantém a sua audiência ali”, conta a especialista.

Conteúdo em colaboração com o consumidor

Os consumidores estão cada vez mais exigentes com o que consomem, com o que compram ou com o serviço que estão adquirindo. E para estar mais próximo dessas pessoas, na opinião de Babi Bono, é preciso mais do que conquistar e produzir algo que faça sentido para elas.

“Nos últimos cinco anos nós ouvimos muito o termo ‘human centered’, que significa colocar o consumidor no centro da história, para criar coisas que ele queira, da forma como ele queira consumir. Usabilidade, design e uma série de outras disciplinas se basearam nisso. Agora, mais do que colocar essa pessoa no centro do processo, se pensa no ‘em colaboração com’. Ou seja, não é mais algo construído ‘para a minha audiência’. Mas algo construído com a ‘minha audiência’. E daí, nesse movimento, a gente vê que as marcas estão tentando trazer o consumidor para perto desde o processo criativo para desenvolvimento de novos produtos até a forma como ele é comunicado. Uma escuta maior do que a comunidade dela quer”, diz a especialista.

Leads? Conversões?Awereness? Ou tudo junto?

Na FCA, Babi foi uma das criadoras do CRIE, sigla para Content Real-time Insight Engagement. Trata-se de um hub de conteúdo, criação, performance e mídia, com cerca de 50 profissionais entre parceiros internos e externos. Como muitas empresas, hoje em dia, olham para os departamento de marketing como um braço do comercial, com cobranças por leads e conversões, perguntamos a Babi se ela encara esse processo como uma coisa natural.

“Todas as empresas hoje têm essa responsabilidade de venda muito forte. A gente está vivendo um processo de virada em relação a modelos de consumo de uma forma geral. Então, está todo mundo preocupado com isso. No CRIE, é claro que existe essa preocupação de fazer com que as campanhas sejam mais efetivas, que as vendas aconteçam. E como em qualquer empresa, a gente precisa mostrar que conteúdo ajuda, sim, a vender. Porém isso está a serviço de toda uma construção, uma estratégia desenvolvida para sustentar uma conversa de marca, independentemente do momento do varejo. Nosso objetivo principal é criar identidade, sustentação, estar próximo do consumidor e criar uma linha de diálogo que faça sentido para ele. É deixar a marca na vida da pessoa pra ela entender que estamos ali em diferentes momentos da jornada de compra dele. Seja para tirar uma dúvida sobre como funciona um botão, seja para falar: “esse carro é para você” ou até para trabalhar o espírito de quem compra um Jeep, que tem a vontade de estar em contato com a natureza, mas que talvez não tenha isso no seu dia-a-dia e que fundo é o que esse cara gostaria de viver. Então, a partir de dados, a gente tem todo um entendimento sobre o comportamento do consumidor e, com isso, criamos conteúdos para manter esse relacionamento próximo”, explica Babi.

Nosso objetivo principal é criar identidade, sustentar a marca, estar próximo do consumidor, criar uma linha de diálogo que faça sentido para ele. É deixar a marca na vida dessa pessoa.

A tendência das in-houses

Um estudo recente mostrou que é uma tendência entre os CMOs internalizar os investimentos e a gestão de mídia nas empresas, especialmente por conta do crescimento do meio digital. Busca-se um maior controle dos dados gerados, entre outras coisas, por novas estratégias de conteúdo, como o Brand Publishing, por exemplo. Em sua viagem recente, um de seus pensamentos que viraram certeza é que a tendência do in-house veio para ficar no mercado de comunicação das marcas.

“Eu tenho acompanhado esse movimento das in-houses, isso é algo global. A gente tem olhado mais para dentro. Até porque o social e a performance têm um timing diferente do offline. No digital a gente consegue testar tudo mais rápido, trocar peças, ver se uma determinada chamada funcionou, se uma foto funcionou. Caso não funcione a gente consegue trocar. E aí você tem um processo de aprovação de um cliente que não apenas está envolvido na criação e na estratégia. Ele está na mesa ao lado. Então, você não precisa entrar em nenhum processo burocrático de aprovação. Esse movimento é de mercado. Há modelos de in-house diferentes acontecendo em vários lugares. Algumas empresas internalizando parte da operação. Outras internalizando a operação inteira. Mas o fato é que o papel das agências muda com isso. A gente entende que as agências precisam atuar não só na comunicação e mais no entendimento do negócio de uma forma geral” avalia Babi Bono.

A gente entende que as agências precisam atuar não só na comunicação e mais no entendimento do negócio de uma forma geral

O exemplo do CRIE

O CRIE, segundo ela, não chega a ser exatamente uma in-house na FCA. Mas tem características do que seria um novo modelo de in-house, com operação e gestão de fornecedores dentro de casa.

“Porém, nós continuamos com as agências. Nós a levamos para dentro de casa e fazemos a estratégia junto com as agências. Essa internalização tem a ver com a inteligência e a estratégia estarem muito dentro de casa. Esse modelo mudou em relação às empresas porque, quanto mais próximo a gente estiver, inclusive, das áreas que resolvem melhor, isso agiliza processos, agiliza criação, a gente coloca campanhas e uma série de coisas na rua muito mais rápido. A parte de performance de mídia está dentro de casa. A gente tem a sala de performance que reúne toda parte de BI e de dados de todas as plataformas, que acompanha o lead, que faz integração com o CRM, que olha tudo o que está acontecendo em social. E tem a minha área, que é a que dá forma e narrativa para isso tudo, que é a parte de conteúdo e de criação, responsável por criar os conteúdos que façam mais sentido para as pessoas, conta Bárbara Bono.